por Bolívar Lamounier - Portal Exame
“Erros acontecem, a diferença é a atitude em relação ao erro. Investigamos e punimos” . Foi assim que Dilma Rousseff respondeu à pergunta sobre Erenice Guerra, ex-braço-direito dela na Casa Civil, ao ser entrevistada pelo Jornal Nacional.
Especificamente, os entrevistadores quiseram saber como ela pretende evitar que casos semelhantes se repitam em seu governo, se ela vier a ser eleita.
Sim, estamos na reta final para a eleição e não vivemos num mundo de anjos. Eu não sou e ninguém deve ser ingênuo a ponto de imaginar que ela fosse responder com seriedade.
“Erros acontecem”, ela sentenciou, e ato contínuo disparou contra Serra, que ao ver dela estaria acobertando o “caso Paulo Preto”.
Espertezas à parte, o assunto merece uma reflexão, e acho acertado começá-la no ponto sugerido por Dilma Rousseff : ”a diferença é a atitude em relação ao erro”.
Que existe um problema de atitude, não cabe dúvida, mas não o que a candidata governista deu a entender. Trata-se, primeiro, da gravidade e da extensão do caso Erenice ; segundo, do metódico trabalho que Lula e a campanha dilmista desenvolveram no sentido de diluir rapidamente o “caso Erenice” .
Em que consiste o caso Paulo Preto ? A “acusação” feita por Dilma Rousseff , no debate da Band, foi que um ex-assessor de Serra teria sumido com cerca de 4 milhões de reais arrecadados para a campanha tucana.
Se isso realmente ocorreu ou não, é um assunto para a polícia. A ela é que cabe apurar os fatos. Mas a própria denúncia petista já indica que o crime, se houve algum, terá ocorrido entre partes privadas.
O affair Erenice Guerra é uma questão completamente distinta ; e basta uma singela recapitulação para se perceber quão inaceitáveis têm sido até aqui as ”atitudes sobre o erro” do governo e de sua candidata .
Primeiro, Erenice Guerra não era uma parte privada, era ministra de Estado, ocupava o segundo posto mais poderoso da República, abaixo só do presidente, e trabalhava no próprio Palácio do Planalto .
Segundo, ela foi durante muitos anos assessora e braço-direito da hoje candidata Dilma Rousseff, que a trouxe do Ministério de Minas e Energia para a Casa Civil .
Terceiro, as denúncias que atingiram a ministra Erenice Guerra, assessores e membros de seu círculo familiar referem-se a práticas de intermediação de negócios com o setor público (lobby, ”propinoduto”) e nepotismo.
Quarto, o governo e a candidata reconheceram por atos e palavras a veracidade parcial ou total das referidas denúncias , tanto assim que ela foi afastada do cargo (ato) e posteriormente atirada aos leões (palavras) tanto por Dilma como pelo próprio Lula.
O apetite dos felinos começou a ser despertado por Lula. Como quem não queria nada, ele deixou escapulir numa entrevista que Erenice pusera a perder a chance de “uma brilhante carreira no serviço público”.
E Dilma, com sua habitual sutileza, afirmou, no debate do dia 12 de setembro :
“Eu tenho, até hoje, a maior e a melhor impressão da ministra Erenice. O que se tem publicado nos jornais é uma acusação contra o filho da ministra. (…) Agora, eu quero deixar claro aqui: eu não concordo, não vou aceitar que se julgue a minha pessoa baseado no que aconteceu com o filho de uma ex-assessora minha”.
E assim a coisa foi indo. Percebendo o tamanho do estrago, Lula foi deixando de lado a desconversa inicial e passando ao ataque, com o evidente propósito de tirar de foco o assunto Casa Civil . No dia 21 de setembro, o jornalista Carlos Alexandre, do Correio Braziliense, fez o relato que transcrevo a seguir ; o grifo é meu.
“O calor da disputa eleitoral exacerba as contradições entre a retórica e a prática da Presidência da República e dos colaboradores da campanha de Dilma Rousseff. No palanque, Lula é a voz mais tonitruante contra a imprensa e maestro do coro para desqualificar as denúncias de que se instalou um balcão de negócios na Casa Civil sob supervisão de Erenice Guerra”.
“As decisões tomadas em consequência do escândalo, entretanto, reforçam a gravidade das acusações. Não apenas a principal assessora da candidata, mas todo o grupo envolvido foi afastado dos holofotes. Se nada houvesse de comprometedor, não haveria razão para desinfetar os gabinetes do Palácio do Planalto”.
Ao Jornal Nacional, Dilma disse que a “diferença” de atitude consiste em que José Serra estaria “acobertando” o caso Paulo Preto, ao passo que “nós investigamos e punimos”.
Nós investigamos e punimos . Será ?
Se o que Dilma tinha em mente ao fazer essa afirmação era a investigação interna do Planalto, a cargo da Comissão de Sindicância Investigativa, ela devia ter antes combinado o script com os russos.
O prazo da mencionada comissão expirou domingo . Ontem o ministro-interino Carlos Esteves Lima assinou portaria prorrogando-o por mais 30 dias. Providência oportuna, quando nada porque livra a comissão de eventuais incômodos que poderiam advir da divulgação de seus resultados antes das eleições.
Fonte: Portal Exame
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